EDUARDO MARAGOTO
Com o passar dos anos, muito tenhem mudado as circunstáncias em que se desenvolve o nosso principal sinal de identidade: o galego. Ao mesmo tempo, foi mudando a própria língua e a atitude da comunidade galegófona quanto a ela. Fala-se menos e transmite-se muito menos às novas geraçons. Basta só olhar para a língua usada polos filhos e filhas de umha grande parte de militantes nacionalistas, impotentes perante a nova correlaçom de forças idiomática.
No Dia das Letras de cada ano costumam escrever-se muitos artigos em que se realizam ‘diagnósticos’ da situaçom, mesmo em jornais escritos habitualmente em espanhol: ‘falta de promoçom’, ‘a igreja nom se galeguiza’, ‘contexto político opressivo’, ‘auto-ódio’, ‘atitude do espanholismo’… Porém, existem outros elementos responsáveis polo declínio da língua aos quais, incompreensivelmente, continua sem dar-se releváncia algumha. Esses elementos, nom obstante, multiplicam a sua importáncia de ano para ano. Quero salientar dous deles: a urbanizaçom da sociedade e o isolamento no contexto internacional que padece o galego.
A urbanizaçom da sociedade chegou já ao último cantinho da Galiza, polo menos no que di respeito à vontade das e dos jovens de imitar hábitos de vida urbanos. É umha vontade bem simples de satisfazer, reconheçamos, com o espetacular progresso comunicacional, no campo audiovisual por exemplo, que estám a viver as sociedades ocidentais. Com este processo em curso, o galego também deveria deixar de ser a língua doméstica e agrária que tem sido, mas facilmente podemos constatar que está longe de ser assim. Recorremos ao espanhol para pôr nome a qualquer objeto ou conceito da vida contemporánea e, nom é preciso dizer, para denominarmos qualquer cousa que, em geral, se compra ou se vende, isto é, praticamente todo o que usamos nos dias de hoje. Continuar a pôr os mesmos exemplos de ‘castelhanismos’ que eu estudei na escola (pueblo, Dios, bueno, carretera…) passou a ser, neste contexto, imensamente redutor. Há quem faga meritórias adaptaçons morfológicas de algumhas palavras, mas devemos perguntar-nos se existe algumha política lingüística capaz, nom só de deter a desfiguraçom formal do galego, mas também de conseguir socializar umha forma nem que seja timidamente galega da ingente quantidade de palavras que cada dia penetram nas falas galegas, através de relaçons comerciais cada vez mais diversificadas. Continuar a confiar, neste enquadramento, nos laboratórios terminológicos que nos proporciona a Real Academia Galega, ou os diferentes departamentos universitários, é tam irrealista como pensar que vamos normalizar o galego obrigando a memorizar a gramática a todos os galegos. Porque se continua entom a desconsiderar a relaçom das nossas falas com as outras variantes do galego-português, saudáveis na medida em que disponhem de meios de comunicaçom fortes que minguam radicalmente este problema?
Também som mui poucas as vozes que se atrevem a tratar com seriedade outro, digamos, ‘problema da língua’, de crescente importáncia: fortalece-se a impressom popular de que a subsidiaçom permanente de umha língua minoritária, desnecessária para as relaçons internacionais, é um esforço inútil. Há muitos anos que essa sensaçom popular existe, mas sempre foi tratada como um simples ‘preconceito’. Porém, a comunicaçom com o exterior continua a avançar e nom parece que o ‘preconceito’ vaia recuar. Cada vez som menos os jovens que chegam aos 25 anos sem ter visitado mais de um país estrangeiro. Parecerá constataçom simplificadora, mas muito menos se se perguntar aos avós deles se sequer chegárom a sair meia dúzia de vezes da sua comarca. Contra isto, os discursos do ‘legado cultural’, da ‘identidade’, etc., nunca deixarám de ter validez, mas é previsível que continuem a perder importáncia.
A luta pola sobrevivência
Por ocasiom do debate parlamentar sobre o acordo que aproxima as ortografias de Portugal e do Brasil, realizado em Lisboa, Carlos Reis, um dos seus grandes defensores, fijo umha advertência aos detratores do mesmo: daqui a algumhas décadas só um clube seleto de quatro ou cinco línguas continuarám a lutar pola sobrevivência. Portugal, continuava, nom deveria perder o trem desse clube recusando-se a fortalecer-se, neste caso através de um acordo ortográfico com o país lusófono mais forte: o Brasil.
Eu nom pido a ninguém que renuncie à defesa da mais minoritária das línguas, mas creio que seria um exercício de responsabilidade refletir sobre umha hipótese que de facto já está instalada no senso comum da maioria das pessoas, também das galego-falantes: é evidente que em poucas décadas aquelas línguas que nom disponham de um ou vários estados para promovê-las tenhem um futuro incerto. Haverá quem diga agora, claro: ‘o galego há-se de falar se os galegos querem’ ou ‘se nom desapareceu em oito séculos, porque nom vai sobreviver agora?’ Sim, sempre haverá quem se refugie num otimismo vazio, disfarçado de patriotismo se o contexto o requer, mas o preocupante é que esse discurso centraliza a atividade de umha boa parte dos agentes culturais e lingüísticos deste país, incapazes de pensar o futuro com sequer 20 anos de antecedência, como ficou demonstrado desde a aprovaçom da Lei de Normalizaçom Lingüística. Como noutros assuntos (urbanismo, ambiente…) a responsabilidade política reside precisamente em ver além do ano em curso, da leirinha. O populismo ortográfico, como outros, poderá tornar-nos o caminho mais fácil agora, mas costuma nom ser o melhor para o futuro, cada vez mais presente.
Nom sou dos que penso que que a adoçom do ‘nh’ vai pôr todas as pessoas a falar galego, mas preocupa-me que parte do nosso mundo cultural continue instalado no ‘lamento’, virando as costas às reflexons que pedem avanços mais decididos no caminho da integraçom no mundo lusófono. Entretanto, a Internet provocou que se multiplicassem as pessoas que já caminham nesse sentido. Som ainda minoria, mas a motivaçom que as move marca significativamente a diferença. Será que vem luz no fundo do túnel, apesar das difíceis circunstáncias de isolamento que padece o reintegracionismo na atualidade?
Publicação original
http://www.vieiros.com/columnas/opinion/456/estamos-a-preparar-o-galego-para-o-futuro, junho de 2008
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